AULA – 01 – SEGUNDOS ANOS
PROF: LUIZ CARLOS ARPINI
Cultura: Um Conceito
Antropológico
09/02/2013
Desde a antigüidade, tem-se
tentado explicar as diferenças de comportamento entre os homens, a partir das
diversidades genéticas ou geográficas.
As características biológicas não
são determinantes das diferenças culturais: por exemplo, se uma criança
brasileira for criada na França, ela crescerá como uma francesa, aprendendo a
língua, os hábitos, crenças e valores dos franceses.
Podemos citar, ainda, o fato de
que muitas atividades que são atribuídas às mulheres numa cultura são responsabilidade
dos homens em outra.
O ambiente físico também não
explica a diversidade cultural. Por exemplo, os lapões e os esquimós vivem em
ambientes muito semelhantes – os lapões habitam o norte da Europa e os esquimós
o norte da América. Era de se esperar que eles tivessem comportamentos
semelhantes, mas seus estilos de vida são bem diferentes. Os esquimós constróem
os iglus amontoando blocos de gelo num formato de colméia e forram a casa por
dentro com peles de animais. Com a ajuda do fogo, eles conseguem manter o
interior da casa aquecido. Quando quer se mudar, o esquimó abandona a casa
levando apenas suas coisas e constrói um novo iglu.
Os lapões vivem em tendas de
peles de rena. Quando desejam se mudar, eles tem que desmontar o acampamento,
secar as peles e transportar tudo para o novo local.
Os lapões criam renas, enquanto os
esquimós apenas caçam renas.
Outro exemplo são as tribos de
índios que habitam uma mesma área florestal e têm modos de vida bem diferentes:
algumas são amigáveis, enquanto outras são ferozes; algumas alimentam-se de
vegetais e sementes, outras caçam; têm rituais diferentes; etc
O comportamento dos indivíduos
depende de um aprendizado, de um processo chamado endoculturação ou
socialização. Pessoas de raças ou sexos diferentes têm comportamentos
diferentes não em função de transmissão genética ou do ambiente em que vivem,
mas por terem recebido uma educação diferenciada
Assim, podemos concluir que é a
cultura que determina a diferença de comportamento entre os homens.
O homem age de acordo com os seus
padrões culturais, ele é resultado do meio em que foi socializado
Para Edward Tylor, 1871:
Cultura é o todo complexo que inclui
conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra
capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro de uma sociedade.
Tylor, foi o primeiro a formular
o conceito de cultura do ponto de vista antropológico da forma como é utilizado
atualmente. Na verdade, ele formalizou uma idéia que vinha crescendo desde o
iluminismo. John Locke, em 1690, afirmou que a mente humana era uma caixa vazia
no nascimento, dotada de capacidade ilimitada de obter conhecimento, através do
que hoje chamamos de endoculturação,
Tylor enfatizou a idéia do
aprendizado na sua definição de cultura.
O homem é um ser predominantemente cultural.
Graças à cultura, ele superou suas limitações orgânicas. O homem conseguiu
sobreviver através dos tempos com um equipamento biológico relativamente
simples.
Um esquimó que deseje morar num
país tropical, adapta-se rapidamente, ele substitui seu iglu e seus grossos
casacos por um apartamento refrigerado e roupas leves – enquanto o urso polar
não pode adaptar-se fora de seu ambiente.
A cultura é o meio de adaptação
do homem aos diferentes ambientes. Ao invés de adaptar o seu equipamento
biológico, como os animais, o homem utiliza equipamentos extra-orgânicos. Por
exemplo, a baleia perdeu os membros e os pêlos e adquiriu nadadeiras para se
adaptar ao ambiente marítimo. Enquanto a baleia teve que transformar-se ela
mesma num barco, o homem utiliza um equipamento exterior ao corpo para navegar.
A cultura é um processo
acumulativo. O homem recebe conhecimentos e experiências acumulados ao longo
das gerações que o antecederam e, se estas informações forem adequada e
criativamente manipuladas, permitirão inovações e invenções. Assim, estas não
são o resultado da ação isolada de um gênio, mas o esforço de toda uma
comunidade.
Não existe um consenso, na
antropologia moderna, sobre o conceito de cultura.
Roger Keesing, antropólogo, em
seu artigo "Theories of Culture" (1974), define cultura de acordo com
duas correntes:
• As teorias que consideram a
cultura como um sistema adaptativo: culturas são padrões de comportamento
socialmente transmitidos que servem para adaptar as comunidades humanas ao seu
modo de vida (tecnologias, modo de organização econômica, padrões de
agrupamento social, organização política, crenças, práticas religiosas, etc.)
• As teorias idealistas da
cultura são divididas em três abordagens:
• A primeira considera cultura
como sistema cognitivo: cultura é um sistema de conhecimento, "consiste de
tudo aquilo que alguém tem de conhecer ou acreditar para operar de maneira aceitável
dentro da sociedade"
• A segunda abordagem considera
cultura como sistemas estruturais: define cultura como "um sistema
simbólico que é a criação acumulativa da mente humana. O seu trabalho tem sido
o de descobrir na estruturação dos domínios culturais – mito, arte, parentesco
e linguagem – os princípios da mente que geram essas elaborações culturais.
• A terceira abordagem considera
cultura como sistemas simbólicos: cultura é um sistema de símbolos e
significados partilhados pelos membros dessa cultura que compreende regras
sobre relações e modos de comportamento.
A cultura é uma lente através da
qual o homem vê o mundo - pessoas de culturas diferentes usam lentes diferentes
e, portanto, têm visões distintas das coisas.
O fato de que o homem vê o mundo
através de sua cultura tem como conseqüência a propensão em considerar o seu
modo de vida como o mais correto e o mais natural (isso é denominado
etnocentrismo), depreciando o comportamento daqueles que agem fora dos padrões
de sua comunidade – discriminando o comportamento desviante.
Comportamentos etnocêntricos
resultam em apreciações negativas dos padrões culturais de povos diferentes,
práticas de outros sistemas culturais são vistas como absurdas.
O etnocentrismo é um
comportamento universal. É comum a crença de que a própria sociedade é o centro
da humanidade.
A reação oposta ao etnocentrismo
é a apatia. Em lugar da superestima dos valores de sua própria sociedade, num
momento de crise os indivíduos abandonam a crença naquela cultura e perdem a motivação
que os mantém unidos.
Por exemplo, os africanos, quando
foram trazidos como escravos para uma terra estranha, com costumes e línguas
diferentes, perdiam a motivação de continuar vivos e muitos praticavam
suicídio.
Embora nenhum indivíduo conheça
totalmente o seu sistema cultural, é necessário que o indivíduo tenha um mínimo
de conhecimento da sua cultura para conviver com os outros membros da
sociedade. Nenhum indivíduo é perfeitamente socializado. São estes espaços que
permitem a mudança.
Qualquer sistema cultural está
num contínuo processo de mudança.
Existem dois tipos de mudança
cultural: interna, resulta da dinâmica do próprio sistema cultural. Esta
mudança é lenta; porém, o ritmo pode ser alterado por eventos históricos, como
catástrofe ou uma grande inovação tecnológica.
A mudança externa é resultado do
contato de um sistema cultural com outro. Esta mudança é mais rápida e brusca.
O tempo é um elemento importante
na análise de uma cultura.
Assim, da mesma forma que é
importante para a humanidade a compreensão das diferenças entre os povos de
culturas diferentes, é necessário entender as diferenças que ocorrem dentro do
mesmo sistema.
ABORDAGEM ANTROPOLÓGICA
A existência humana é marcada pela cultura e é
ela a própria fundamentação da humanidade. Cultura é criação/ aprendizagem/
criação. É modificada, enriquecida, num processo constante, consciente e
inconsciente, por acaso e por necessidade. Por isso a cultura marca, registra e
pauta as condutas humanas. O ser humano é muito pouco programado.
A ANTROPOLOGIA E SUAS TEORIAS
ACERCA DAS CULTURAS
Com o avanço da colonização e a partir das
viagens do século XVIII, os europeus passaram a manter contato com outros povos
e a incluí-los na reflexão sobre a evolução da humanidade. Várias maneiras de
interpretar a evolução humana surgiram; dentre elas, as versões monogenista e
poligenista. A monogenia, seguindo a idéia de "perfectibilidade"
defendida por Rousseau, considerava a evolução da humanidade um gradiente que
ia desde o estágio menos avançado (primitivo) ao mais avançado (civilização).
As dissimilitudes entre os entre os homens eram consideradas provas dos
diferentes estágios pelos quais passavam no seu processo evolutivo. Essa forma
de interpretação foi adotada pelos etnólogos na reconstrução do passado dos
povos "primitivos". A poligenia considerava que os diferentes centros
de criação explicavam as diferenças físicas e morais entre os homens. Os
poligenistas acreditavam que mesmo que tivessem ancestrais comuns, os homens
diferenciaram-se tanto num dado momento que não restou a possibilidade de cruzamento
sem que dele resultasse degeneração.
A partir da obra de Darwin, A
origem das espécies, publicada em 1859, vários ramos do conhecimento passaram a
adotar uma perspectiva evolucionista: a lingüística, a pedagogia, a sociologia,
a filosofia, a política. Na política, o imperialismo europeu se valeu da idéia
de sobrevivência dos mais aptos para justificar o avanço do colonizador. Uma
teoria sobre as raças foi sistematizada a partir do darwinismo social,
preconizado por Herbert Spencer. Essa teoria estabelecia um paralelo
comparativo entre as diferenciações entre os homens e as diferenças que existem
entre os animais - o asno e o cavalo, por exemplo - e rejeitava a idéia de
livre arbítrio do homem, pois que ele estaria fadado a receber características étnico-culturais
do meio ao qual pertenciam e condenava a miscigenação, valorizando os
"tipos puros" considerava a miscigenação. Essa teoria surgiu dos
poligenistas e veio a legitimar o domínio de um grupo étnico sobre outro.
Nesse contexto, surge a Antropologia,
que teve o evolucionismo como princípio orientador. Dividindo a evolução em
estágios, os etnólogos abandonaram o uso convencional do tempo e utilizaram-se
de etapas construídas logicamente para referenciar o homem. Na escala
evolutiva. Morgan, em sua obra Ancient Society, descreve três estágios que
seriam aplicáveis na explicação da escala de evolução humana: selvageria,
barbárie e civilização.
O estudo das sociedades
"primitivas" era feito tendo por base documentos escritos, onde havia
o relato dos costumes, mitos, objetos utilizados pelos "selvagens"
etc. Através da utilização do método comparativo, os antropólogos analisaram
essas sociedades, guiados pela idéia de progresso. Esse método recebeu vários
ataques, sendo Franz Boas o seu principal crítico. Uma das críticas dizia
respeito ao fato de os elementos culturais serem analisados fora do seu
contexto: a partir de uma parcela mínima da cultura inferia-se sobre a
totalidade.
Dessa breve digressão, podemos
concluir que, apesar de não podermos considerar os usos advindos dos estudos
antropológicos da época como os mais "honestos", sem dúvida nenhuma
foi um grande avanço o abandono da análise dos dados coletados por viajantes e
a adoção da pesquisa de campo como meio de investigação. Da mesma forma, pode
ser considerado um passo significativo o abandono da utilização da perspectiva
evolucionista na análise dos povos não-europeus, bem como das suas explicações
psicológicas e intelectualistas. Porém, o surgimento da corrente funcionalista
na Antropologia - da qual Malinowski foi o precursor - trouxe consigo uma certa
dose de determinismo, ao considerar o processo de colonização como dado, como
algo inevitável. A necessidade do estudo dessas sociedades era justificada pelo
avanço do imperialismo europeu sobre os povos "primitivos" e as
comparações feitas entre essas sociedades e a sociedade da qual fazia parte o
pesquisador não preocupavam-se em situá-las mecanicamente numa escala
evolutiva. Os povos estudados eram focalizados em situação, ou seja, seu
processo de auto-construção era avaliado a partir da contextualização dos
fenômenos culturais.
Bronislaw Malinowski, tocado pelo
"nojo à civilização", dedicou-se ao estudo das sociedades
"primitivas" imbuído do objetivo de "apreender o ponto de vista
do nativo, sua relação com a vida, compreender a sua visão de mundo."
Malinowski procedeu a explicação do todo social a partir da construção de
unidades significativas de análise, que seriam compostas por elementos
representativos do todo e, assim, ulteriormente, encadeadas na análise. A essas
unidades ele chamou isolats, e utilizou as instituições como objeto de análise.
Para ele, as necessidades biológicas (primárias), determinavam a existência de
outras necessidades: as necessidades culturais (secundárias). A cultura seria o
aparato instrumental que inicialmente estaria ligado à satisfação das
necessidades biológicas, e à medida em que houvesse o desenvolvimento, o
crescimento da população e a diferenciação estrutural, ela passaria a
constituir-se num meio próprio. Os padrões culturais determinariam o surgimento
do estatuto, que é o liame entre as instuições. No processo de análise da
realidade, Malinowski vê como fundamentais três procedimentos metodológico: a
observação de todos os costumes dos nativos, a apreensão das narrativas orais e
a utilização do método estatístico. Para ele, através da observação do
comportamento dos nativos seria captados os "imponderáveis da vida
real" - os elementos não abarcados pela análise estatística e que são "a
carne e o sangue" do arcabouço teórico da pesquisa.
A antropologia de Malinowski dava
maior visibilidade aos sujeitos integrantes da cultura em estudo, como forma de
garantir a legitimidade científica da investigação. O abandono de pré-noções,
para ele seria fundamental:
"Conhecer bem a teoria científica e estar
a par de suas últimas descobertas não significa estar sobrecarregado de idéias
preconcebidas. Se um homem parte numa expedição decidido a provar certas
hipóteses e é incapaz de mudar seus pontos de vista constantemente,
abandonando-os sem hesitar ante a pressão da evidência, sem dúvida seu trabalho
será inútil."
Radcliffe-Brown, também
funcionalista, propunha a combinação das tarefas de pesquisa de campo e de
gabinete. Ele apontava a necessidade de estudos comparativos sistemáticos para
que a Antropologia não se tornasse mera etnografia. O método indutivo, proposto
também por ele, possibilitaria o estabelecimento de regularidades e leis
gerais. Ele enfatiza o aspecto funcional de costumes como o rapto da noiva,
hostilidade inter-grupal, entre outros, baseando-os na idéia de oposição que
fundaria sociedades divididas em metades exogâmicas. Radcliffe-Brown chegou à
explicação histórica de cada uma dessas sociedades em particular e,
consequentemente, ao problema do totemismo e da natureza e funcionamento das
relações e estruturas sociais baseadas em "oposição", que são
fenômenos gerais. Dessa forma, ele articulou os métodos histórico e comparativo
(aliás, numa articulação que ele propunha aos estudos antropológicos em geral),
considerando, entretanto, que o método histórico seria específico da Etnologia
e o método comparativo mais afeito à Antropologia Social.
Radcliffe-Brown, que também
considerava de suma importância a pesquisa de campo, rejeitava o uso do conceito
de cultura em sua análise, pois considerava-o desprovido do caráter empírico
necessário à análise social. A abstração que o termo sugere seria substituída
pela realidade empírica das estruturas sociais, que eram o seu objeto de
estudo. Para ele, o indivíduo adquire relevância analítica quando inserido
nessa rede de relações, desempenhando os seus diversos papéis. Aliado a esse
conjunto de relações que se dão entre os indivíduos, está o conceito de forma
estrutural. Para Radcliffe-Brown, a forma estrutural seria o padrão das
relações que ocorrem na estrutura, tendo como maior característica a constância
do mesmo. Ele não nega mudanças na forma estrutural, porém, admite que elas
ocorrem de uma maneira mais lenta. A totalidade fica, assim melhor explicada na
teoria de Radcliffe-Brown, pois possibilita a visualização da mesma através dos
conceitos de estrutura e forma estrutural. Com a idéia de coerência funcional,
ele exprime a necessidade de que os elementos estejam interligados por uma
mutualidade de relações que, se não forem observadas, levam ao surgimento de
conflitos.
Vê-se que o funcionalismo possibilitou o
diálogo entre pesquisador e pesquisado a partir da adoção de uma postura
flexível e menos dogmática perante o seu objeto de estudo, porém, nota-se que a
utilização do relativismo como princípio orientador proporcionava um certo
distanciamento e faz com que o investigador, ao abordar o "nativo",
estabeleça uma relação na qual o entrevistado realiza o papel de mero
informante, sem que haja uma troca de experiências visando ao conhecimento e
questionamento culturais mútuos. Esse procedimento decorre do fato de que para
os relativistas, as culturas são válidas em si mesmas, consequentemente, não há
porque questionar as normas e valores nela imbricados. A postura do
investigador que utiliza-se do relativismo é a de um mero coletor de
informações. O relativismo, a partir da sua proposta de validade das práticas
inerentes às varias culturas, inspirada no alemão Herder, não dá margem a uma
interação subjetiva efetiva entre os envolvidos na relação e não possibilita a
disseminação de valores universais como a liberdade e a igualdade.
CULTURA: UM CONCEITO
ANTROPOLÓGICO
Introdução
Pretende-se aqui delinear a
evolução do conceito de cultura, pinçando idéias defendidas no passado tais
como, o determinismo biológico, geográfico, antecedentes históricos do conceito
de cultura, mostrando a conciliação da unidade biológica e da grande
diversidade cultural da espécie humana. O desenvolvimento do conceito de
cultura, idéias sobre a origem da cultura e teorias modernas sobre cultura
organizacional e, fatores que compõem a cultura brasileira. Porém, ressalta-se
que não se pretende esgotar a discussão nesta apresentação, pois a natureza e a
amplitude do tema não permite findar esta discussão devido as perspectivas
multidisciplinares e das diversas abordagens em que se pode visualizar o
emprego e a intersecção do estudo da cultura, tais como a semiótica e a hermenêutica.
Origem da cultura e antecedentes
históricos do conceito de cultura
O termo cultura segundo o Novo
Dicionário da língua portuguesa significa “ato, efeito ou modo de cultivar.
Complexo dos padrões de comportamento, das crenças, das instituições e de
outros valores espirituais e materiais transmitidos coletivamente e característica
de uma sociedade" (p.508). Porém no final do século XVIII e no princípio
do século XIX, o termo germânico Kultur era utilizado para simbolizar todos os
aspectos espirituais de uma comunidade, enquanto a palavra francesa
Civilization referia-se principalmente às realizações materiais de um povo.
Mais tarde Edward Tylor (1832-1917) sintetizou os dois termos no vocábulo
inglês Culture, que
"tomado em seu amplo sentido
etnográfico é este todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte,
moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo
homem como membro de uma sociedade".
Segundo Laraia (1996: 25) com a
definição acima apresentada Tylor abrange em suma só palavra todas as
possibilidades de realização humana, além de marcar fortemente o caráter de
aprendizado da cultura em oposição a idéia de aquisição inata, transmitida por
mecanismos biológicos.
Há muito se estuda o
comportamento dos animais, inclusive o comportamento do homem, com a finalidade
de entender o que o conduz as atividades cotidianas e, as relações entre eles
na formação dos grupos e na relação entre outros grupos. Confúcio (VX séc. a
C.) enunciou que "a natureza dos homens é a mesma, são os seus hábitos que
os mantêm separados" este é um pensamento compartilhado por vários
estudiosos até a atualidade, inclusive adotado pelas ciências sociais quando se
trata de estudos inerentes a cultura organizacional. Pois, não há como se
aceitar algo como bom ou mal, sem uma análise prévia, quando esta não é prática
em sua terra, isto vale para práticas de gestão sugeridas a serem adotadas em
uma organização. Há que se observar e analisar as possibilidades de adequação.
Segundo Sahlins apud Laraia
(1996: 24),
"(...) a posição da moderna
antropologia é que a cultura age seletivamente, e não casualmente, sobre o seu
meio ambiente, explorando determinadas possibilidades e limites ao
desenvolvimento, para o qual as forças decisivas estão na própria cultura e na
história da cultura."
Apesar da evolução do conceito de
cultura demonstrar que as questões biológicas e geográficas não interferem nas
ações humanas, ainda existe alguns resquícios no que diz respeito as questões
referentes a supremacia de raça (inteligência) e da melhor localização
geográfica (nordeste brasileiro).
Desenvolvimento do conceito de
cultura
O determinismo biológico, bem
como o geográfico são idéias que no passado foram consideradas relevantes para
conceituar cultura. Com o passar do tempo diversas investigações foram
realizadas e chegou-se a conclusão de que estas teorias, apesar de terem sido
importantes para o entendimento de algumas dimensões da natureza humana,
apresentando limitações e inconsistência para o entendimento do conceito de
cultura. Aí então, inaugura-se uma nova fase de estudos e interpretação de
culturas.
Segundo Leibniz apud (Laraia,
1986) a natureza nunca age por saltos, analogamente conclui-se que, a cultura
também não age por saltos, ela é resultado do acúmulo das ações dos homens, que
inclusive altera a própria natureza, pois é necessário compreender a época em
que se viveu e consequentemente o background intelectual de quem ou do que está
se analisando.
A comunicação é um instrumento
decisivo para a assimilação da cultura, pois a experiência de um indivíduo é
transmitida aos demais, criando assim um interminável processo de acumulação
permeado por valores cristalizados, o que nos leva a afirmar que a linguagem
humana é um produto da cultura. Daí a necessidade de identificar as
determinadas formas de comunicação que atinja todos as pessoas da organização
quando da transmissão de uma mensagem.
Pois, para Hoebel apud (Barros
& Prates, 1996: 15),
"O homem é o único animal
que fala de sua fala, pensa o seu pensamento, que responde à sua própria
resposta, que reflete o seu próprio reflexo e é capaz de diferenciar-se mesmo
quando está se adaptando as causas comuns e estímulos comuns".
Comportamentos compartilhados são
componentes da cultura o que nos leva inclusive a afirmar que, teorias
behavioristas (Watson - condicionamento), Cognitivista (Piaget-psicogenética)
quando aplicadas, mesmo que inconscientemente por um grupo de pessoas
determinam algumas características culturais em relação ao padrão de
comportamento. Normas impostas por organizações determinam padrões de comportamento,
marcando de forma indelével a cultura organizacional. Portanto, pode-se afirmar
que diferenças culturais não são genéticas e sim adquiridas no decorrer do
tempo.
"Possuidor de um tesouro de
signos que tem a faculdade de multiplicar infinitamente, o homem é capaz de
assegurar a retenção de suas idéias (...), comunicá-las para outros homens e
transmiti-las para os seus descendentes como herança sempre crescente."
(Turgot apud Laraia 1986, 27).
De acordo com Kluckhohn apud
Geertz (1989: 14) cultura pode ser vista como:
“...o modo de vida global de um
povo; 2) legado social que o indivíduo adquire do seu grupo; 3) uma forma de
pensar, sentir e acreditar; 4) uma abstração do comportamento; 5)Uma teoria,
elaborada pelo antropólogo, sobre a forma pela qual o grupo de pessoa se
comporta realmente; 6) um celeiro de aprendizagem em comum; 7) um conjunto de
orientações padronizadas para os problemas recorrentes; 8) comportamento
aprendido; 9) um mecanismo para regulamentação normativa do comportamento; 10)
um conjunto de técnicas para se ajustar tanto ao ambiente externo como em
relação aos outros homens; 11) um precipitado da história.”
Ao correlacionar o conceito de
cultura apresentado por Kluckhohn com a "praxis" organizacional,
emerge daí padrões de comportamento (normas), processo de adaptação (símbolos e
signos), tecnologia e componentes ideológicos (religião, mitos, cerimônias), ou
seja, valores compartilhados pelos membros da organização, resultado do
processo de individuação, isto é, de atitudes individuais que ao mesmo tempo
que interfere no comportamento do grupo, interfere na atitude individual de
cada membro da organização, resultando numa configuração impar de cultura organizacional.
Teorias modernas sobre cultura
A utilização da antropologia para a análise organizacional
deve-se ao fato de que esta área do conhecimento consegue abranger as dimensões
da linguagem, do simbolismo, do espaço, do tempo e da cognição. A abordagem
antropológica intensificou-se na década de 80, inclusive gerando críticas pelo
uso acrítico, explicando tudo e qualquer coisa através do conceito de cultura.
Porém, para seus defensores o grande mérito desses estudos foi justamente
chamar a atenção para a dimensão simbólica que
permeia a organização e os seus
grupos. A necessidade de encontrar os significados das relações entre os
elementos da cultura de uma organização e que dão sentido ao quotidiano das
mesmas justifica o apelo ao estruturalismo, do qual Geertz (1989) é um dos
representantes.
Para Geertz (1989: 15) o conceito
de cultura é essencialmente semiótico, que vem de encontro com o pensamento de
Max Weber "que o homem é um animal amarrado a teias de significados que
ele mesmo teceu". Geertz concebe a cultura como uma "teia de
significados" que o homem tece ao seu redor e que o amarra. Busca-se
apreender os seus significados (sua densidade simbólica).
Um dos métodos utilizados para
entender a cultura é a descrição etnográfica que se baseia nas palavras dos
informantes e o pesquisador interpreta-a e compartilha os significados juntamente
com seus informantes, ou seja, aqueles que na verdade possuem o roteiro
simbólico do que concebem e articulam logicamente entre suas visões de mundo. O
respeito rigoroso à visão que os nativos têm sobre os aspectos analisados
(sobre si mesmo, seus conhecimentos e práticas cotidianas, sua concepção do
mundo) é fundamental.
Ao se analisar a cultura
organizacional sob a ótica antropológica, faz-se necessário interpretar e
decodificar a visão de mundo subjacente aos sistema de gestão utilizados e
praticados pelas organizações. Pois a prática etnográfica estabelece relações e
sendo assim é dialógica, ou seja é uma via de mão dupla, na qual o mesmo objeto
ou fato deve ser visto e sentido do mesmo modo, o que requer uma descrição
densa do que se está diagnosticando, que segundo Goodenough apud Geertz (1989:
21) "a cultura (está localizada) na mente e no coração dos homens".
Alguns estudiosos contemporâneos
tal como Schein, apresentam alguns modelos para diagnosticar a cultura
organizacional. Para Schein apud Monteiro et.al.(1999: 74) as categorias para
investigar o universo cultural de uma organização são:
1) Analisar o teor e o processo
de socialização dos novos membros;
2) Analisar as respostas a
incidentes críticos da história da organização;
3) Analisar as crenças, valores e
convicções dos criadores ou portadores da cultura;
4) Explorar e analisar junto a
pessoas de dentro da organização as observações surpreendentes descobertas
durante as entrevistas.
As categorias apresentadas por
Schein vem sendo largamente utilizadas nas investigações sobre cultura
organizacional, inclusive se tem chegado a algumas conclusões tais como: a
importância do papel dos fundadores da organização no processo de moldar seus
padrões culturais, que imprime sua visão de mundo aos demais membros da
organização e, também sua visão do papel que a organização deve desempenhar no
mundo.
Dentre os estudiosos da
atualidade encontra-se Fleury, que apresenta o seguinte conceito de cultura
organizacional:
“Cultura organizacional é um
conjunto de valores e pressupostos básicos, expressos em elementos simbólicos
que, em sua capacidade de ordenar, atribuir significações, construir a
identidade organizacional, tanto agem como elementos de comunicação e consenso,
como ocultam e instrumentalizam as relações de dominação.” (Fleury, 1991: 06).
Smircich apud Monteiro et al.
(1999: 73-74) propõe duas linhas de pesquisa a serem seguidas na investigação
da cultura organizacional que são:
1) A cultura como uma variável,
como alguma coisa que a organização tem, estas variáveis são independentes
externa (cultura da sociedade onde a organização está inserida) e interna
(produtos culturais como lendas, ritos, símbolos).
2) A cultura como raiz da própria
organização, algo que a organização é, considerando a organização como um
fenômeno social.
A cultura não é determinante nas
tomadas de decisões em uma organização, mas influencia sobremaneira nas
diretrizes e práticas a serem adotadas, pois é um instrumento de poder a ser
utilizado pelos gestores.
Uma visão antropológica
Para Beyer & Trice (1986), o rito se
configura como uma categoria analítica privilegiada para desvendar a cultura das
organizações, que é composta por redes de concepções, normas e valores, que são
tão tomados por certos que permanecem submersas à vida organizacional. Para
Horton & Hunt (apud Fleury, 1989), a cultura é tudo aquilo que é apreendido
e partilhado pelos membros de uma sociedade. Esse conceito utiliza-se do método
funcional, ou seja, a sociedade sofreu segmentação causada pela divisão de
trabalho. Para Hofstede (apud Fleury, 1989), a cultura se baseia em modelo de
pensamento que se transfere de pessoa para pessoa. Apesar desses pensamentos
situarem-se na mente das pessoas, ficam cristralizados nas instituições e nos
produtos tangíveis de uma sociedade.
Já para Horton & Hunt (1980),
a cultura é tudo aquilo que é socialmente apreendida e partilhada pelos membros
de uma sociedade. Desta forma, conclui-se que a antropologia funcional explica
a gênese da cultura de uma sociedade e que as subculturas nasceram dentro deste
mesmo processo funcional, pelo motivo de a sociedade ter sofrido segmentação
causada pela divisão de trabalho e ainda que cultura é adequada por surgir uma
necessidade a ser satisfeita, e se manteve porque se provou ser conveniente
para um fim colimado.
Lakatos (1979) define que a cultura é um
modelador de comportamento e está presente em qualquer agrupamento de pessoas
com características próprias a cada um deles. Malinowski (1965) afirma que a
cultura não é estática e que acompanha as modificações da sociedade; desta
forma conclui-se que a organização formal é dinâmica e assim se transforma de acordo
com as interações sociais.
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